Por Martihene Oliveira
A internet, em tempos da era tecnológica, tem sido uma das principais ferramentas de comunicação social e, quando falamos de comunicação, moradoras e moradores de comunidades periféricas são exemplo de criatividade, inventando mecanismos que driblam a falta de acesso a esse recurso que permite a troca de informações entre a sociedade, de forma simultânea, através do compartilhamento imediato de dados.
É o caso da Coletiva Cabras, um grupo de mulheres (cis e trans), estudantes, trabalhadoras e mães, majoritariamente pretas, que atua na comunidade do Bode, no bairro do Pina, zona sul recifense, pelos direitos de gênero, raça, classe, contra o machismo e a misoginia, em defesa dos Direitos Humanos. Na pandemia do coronavírus, sem sede, o maior desafio para a coletiva foi se comunicar com as mulheres e crianças do território, para informar sobre as atividades que produziam.
“Lutamos o tempo todo para não sermos silenciadas e nem apagadas. O poder público se utiliza de mecanismos para nos privar do acesso à internet. Taxas altas da cobrança desse serviço fizeram com que mulheres em situação de violência doméstica, por exemplo, vivessem de forma excludente no período de isolamento da Covid-19. O mesmo acontecia com as crianças que não conseguiam acesso às aulas através do sistema remoto”, afirmou Paulinha Menezes, provocadora social da coletiva.
Foi dessa inquietação que surgiu o Projeto Terra Fértil, que em 2021 e 2022 tornou-se o instrumento principal para as atividades das mulheres. Com a intenção de combater a violência doméstica e fortalecer a democratização da internet na comunidade do Bode, a Cabras procurou uma empresa de internet do local, que não se recusou a abraçar a proposta, disponibilizando acesso gratuito na praça principal. “Vale salientar que a empresa ofereceu até outros pontos de acesso para a nossa coletiva, mas, devido ao pouco recurso que temos, ficamos apenas na Praça da Bala, ou Praça S, como também é conhecida, uma vez que precisávamos arcar com o equipamento que serviria de suporte para veicular a rede”, complementou.
Na ausência do Poder Público em relação a políticas públicas que fomentem a democratização de rede para todos, uma pesquisa do Instituto Locomotiva, em 2020, constatou que 30% dos moradores de favela não aprovam a qualidade do serviço de internet móvel 3G e 4G. Já sobre internet na residência, 13% da população periférica possui zero acesso. De todas as favelas brasileiras, 43% delas consideram o acesso à internet ruim.
As mulheres da comunidade do Bode são o público-alvo da Coletiva Cabras, são elas que movimentam a comunidade quando se unem para as cobranças ao Poder Público. “É importante que os caras saibam que nós não somos inimigas, só chegamos para somar. Sem as mulheres da comunidade não há como discutir ações do poder público”, reafirma Paulinha Menezes, que recentemente, junto com as companheiras, sofreu ataques e ameaças no território por causa do trabalho que realizam.
Através do Projeto Terra Fértil, ações como mutirões de vacinas, mutirão jurídico, dentre outras atividades desenvolvidas por elas, são executadas de maneira recorrente na comunidade.